terça-feira, 31 de julho de 2007

Três poemas.

A une passante
[Charles Baudelaire]

La rue assourdissante autour de moi hurlait.
Longue, mince, en grand deuil, douleur majestueuse,
Une femme passa, d'une main fastueuse
Soulevant, balançant le feston et l'ourlet;

Agile et noble, avec sa jambe de statue.
Moi, je buvais, crispé comme un extravagant,
Dans son oeil, ciel livide où germe l'ouragan,
La douceur qui fascine et le plaisir qui tue.

Un éclair... puis la nuit ! - Fugitive beauté
Dont le regard m'a fait soudainement renaître,
Ne te verrai-je plus que dans l'éternité ?

Ailleurs, bien loin d'ici! trop tard! jamais peut-être!
Car j'ignore où tu fuis, tu ne sais où je vais,
Ô toi que j'eusse aimée, ô toi qui le savais !


A uma passante
[tradução de Ivan Junqueira]

A rua em torno era um frenético alarido.
Toda de luto, alta e sutil, dor majestosa,
Uma mulher passou, com sua mão suntuosa
Erguendo e sacudindo a barra do vestido.

Pernas de estátua, era-lhe a imagem nobre e fina.
Qual bizarro basbaque, afoito eu lhe bebia
No olhar, céu lívido onde aflora a ventania,
A doçura que envolve e o prazer que assassina.

Que luz... e a noite após! – Efêmera beldade
Cujos olhos me fazem nascer outra vez,
Não mais hei de te ver senão na eternidade?

Longe daqui! tarde demais! "nunca" talvez!
Pois de ti já me fui, de mim tu já fugiste,
Tu que eu teria amado, ó tu que bem o viste!


A uma passante (de roupa)
[versão de Mozer Anjos]

Na pilha em torno, apenas roupas do marido.
Escravizada, só, cantando lamentosa,
A mulher engoma – sem ar de desastrosa –
Camisas, ternos, gravatas do referido.

Varizes, mãos calejadas, sina cretina.
E o senhor da casa (no sofá, aprecia
Cerveja) ameaça, reclama, desafia
A triste passadeira cuj’alma é divina.

Que vida!... Dias mordazes!... E a liberdade
Sonhada não chega, não vem... Assim, em vez
Dela as amigas demonstram felicidades.

A mulher passa e repassa por todo o mês!
Às conversas com colegas, porta-se triste:
- Elas têm o melhor ferro-de-passar qu’existe...

quarta-feira, 25 de julho de 2007

Nem toda queda é real

Difícil de acreditar: Marco Aurélio Garcia - assessor especial da presidência - nega que comemorou, frente às câmeras, uma possível falha mecânica no avião da TAM o qual provocou o maior acidente aéreo da história do Brasil. A próxima atitude dele, então, será assumir sua paixão pelo Tabajara Clube de Futebol. Primeira conclusão: duas mentiras. Segunda conclusão: não ocorre uma preocupação sincera com a situação no céu do país.



O vôo 3054 não foi um caso isolado. Em Congonhas, só esse ano, houve quatro deslizes na pista decadente. Vários pilotos têm declarado um sintético medo de pousar, em dias de chuva, no aeroporto da Zona Sul de São Paulo. Alguns, inclusive, combinaram não descer enquanto não acontecerem melhorias. O grooving, se é que existe, está precário. As rotas nacionais, em geral, possuem buracos negros em todo o percurso. A modernização dos aeroportos não acontece porque o órgão responsável - a Infraero - desvia a atenção (dos investimentos) para sabe lá Deus onde. A ANAC possui um presidente, Sr. Milton Zuanazzi, que se preocupa com receber medalhas desmerecidas e tenta empurrar argumentos falhos nas explicações acerca dos problemas da aviação civil.



Engana-se quem pensa que a apuração sobre as causas do acidente está acelerada. O mesmo equívoco se percebe em textos que afirmam que os governantes estão preocupados com o bem-estar da população. E erra, também, o leitor que crê na imediata reformulação da organização aérea do Brasil. Com o exemplo do primeiro parágrafo, claro está que o grande desafio dos excelentíssimos é desviar a atenção do público com relação à deficiência da aviação brasileira. O presidente da República não toma atitudes. Faz alguns dias que leio as mesmas frases: Lula consola as famílias dos mortos; Lula afirma que haverá solução; Lula pede para que ninguém se alarme. Palavras bonitas que, inclusive, meu vizinho e eu poderíamos declarar publicamente. Mas e as reais atitudes? Onde está a cura para essa doença que contamina o setor aéreo?



O chefe máximo não está sozinho. Infelizmente. E para nossa “alegria”, todo mundo continua na mesma lengalenga. Demitiu-se o Waldir Pires. Chamou-se o Nelson Jobim e, a este, foi dada a carta branca para qualquer mudança que ele deseje operar. Ora! A primeira medida deve criar uma ética política nesse Brasil (que canta mas não é feliz...). Outro que caiu foi o J. Carlos Pereira, até então presidente da Infraero (aquela que desvia até pensamento). Oposição e governo concordam que a hora do brigadeiro chegou. Ele se conscientizou disso quando disse “Estou pronto para sair”. Lamento que as mudanças, visíveis e necessárias há muitos anos, só hajam ocorrido após um (negativo) saldo de aproximadamente 200 mortes. Contudo, pensemos: vai melhorar alguma coisa com o troca-troca?



Permutar figurinhas repetidas não resolve o buraco dos álbuns. Com o perdão da morbidez, político ruim só sai de cena quando morre. Enquanto não, trabalhadores sofrem em todos os patamares com um problema que resulta de erros consecutivos e históricos. O sistema aéreo nacional atingiu o ápice da desqualificação: ou moderniza ou as carroças voltam. Segundo reportagem televisiva, há quem gaste R$ 1.100,00, em táxi, para evitar o avião. Bom pra quem tem grana; pior pra quem passa três dias mofando num pátio de aeroporto (... as carroças...). Santos Dumont teria outro motivo para suicidar-se caso presenciasse a atual baderna. Quem cai nunca é o homem público que ri da desgraça alheia. É o cidadão de bem.


terça-feira, 17 de julho de 2007

Um pouco de torcida, muito de mídia: pérfidas

Os atletas brasileiros tornam-se Atlas. Levam o Pan nas costas pois, do governo, só recebem aperto de mão (e alguns apertos indiretos...). Mas com relação às vaias e aplausos ou à gritaria e silêncio (da torcida, claro), isso realmente é muito pessoal.

Alguns competidores, como os da natação, deixaram claro que o agito os ajuda. As meninas da ginástica não curtiram o barulho. No tênis, o silêncio é imprescindível. Enquanto que o futebol tem como décimo segundo jogador a torcida fervente. Inviável é, claro, sair perguntando "Amigo atleta: silêncio ou baderna?". Mas com um pouco de bom senso a gente consegue perceber quais modalidades permitem uma extrapolação de ânimos.

Em minha pessoalidade, detesto o lance de vaias. Quando a gente acompanha a seleção, o Brasil torna verde-e-amarelo todos os países por que passa. Em 70, no México, por exemplo, dos 107.000 torcedores que acompanharam a final da Copa do Mundo, apenas uma meia dúzia vibrou pela Itália; os mexicanos adotaram a seleção canarinho! Por que, então, a gente hostiliza tanto os atletas estrangeiros (a lutadora de taekwondoo mexicana, por exemplo)? Por quê? Em 1994, nos Estados Unidos, novamente a Itália sofreu com o apoio "torcedoral" ao Brasil. Detalhe: não foram vaias que abalaram os jogadores italianos. Treze anos depois, os atletas estadunidenses, em vez de harmonia, só faltam receber bananas na cabeça.

(Às vezes, um "Brazil!" bem gritado - e no momento certo - ajuda bem mais que um monte de bicos em "u".)

Mas ainda há um outro agravante: a televisão. Hoje, quando li na Folha de São Paulo que a emissora do Marinho-Kane perdeu 30% de audiência (de 2006 pra cá), fiquei momentaneamente contente. Depois, entristeci: no fim das contas, uma outra rede vai continuar com a poluição midiocrática... O ideal é uma revolução no jornalismo brasileiro. Os canais não se preocupam com a instrução do povo. Simplesmente, incentivam vaias e gritarias desnecessárias. Inclusive, não ignoro quem ache que o espírito do Roberto manipula o povo que está nas arquibancadas! Porque, pela televisão não há dúvidas da virtuosidade que proporciona.

Pra encerrar, chamou-me a atenção (além dos episódios descritos) o Oscar, hoje, como líder dos baderneiros. Que falar disso? Após ver um ídolo esportivo aos gritos de "Vai cair, Chile, vai cair... uuu...", normal que a platéia "anônima", já iludida pela Globo, siga os passos do (ex)basqueteiro. De doer também. Os atletas Atlas muitas vezes não se mantêm nesse posto.

sexta-feira, 13 de julho de 2007

Um futebol (e o esporte) contraditório

Eu lamento pela (não)educação do povo brasileiro. Ao desprezarmos argentinos, essa atitude só poder relacionar-se com futebol. Quanto à instrução, superam-nos em anos-luz. A média de leitura de cada povo já sugere uma conclusão triste: para o 1,8 livro anual do brasileiro, los hermanos lêem 6,5. O número de livrarias de Buenos Aires é maior que a quantidade de livrarias de todo o Brasil. Ou seja: derrota tupiniquim.

Vaiar não melhora nada. Se a vaia ocorrer fora de contexto, além de não ajudar, subseqüentemente cria uma imagem muito terrível. Custa ser inteligente? Custa buscar informação? No meio de uma manifestação esportiva, em que várias delegações se misturavam em clima social, num evento em que o Bush e Chavez nos pouparam de suas desastrosas presenças - o que significa (senão burrice) assobiar e pensar "nossa, estamos protestando"?

Desgraçadas, também, foram as manifestações anti-Pan. Nessas aglomerações, os assuntos giravam em torno de "Bush no Iraque" e da "ressurreição de Zapata". Tais assuntos interferem, diretamente, no Brasil? Como se não bastasse o momento errado, os ideais também o são. Primeiro: se nós nos voltarmos a nossas invasões endógenas (morais, físicas e espirituais), então ocasionaremos progresso. Segundo: precisamos de um herói nacional (o México é um pouco longe). Não vejo uma santa alma com intuitos verdadeiros na frente do Planalto. Mas quando há um evento interessante, que traz certa alegria para o povo e denota a superação de atletas brasileiros - que treinam sem incentivo federal - espectadores iniciam uma vaia que será estampada no mundo inteiro: "O Pan dos sem educação". Francamente.

Há quem apóie a vulgar atitude. Afirmam: "Baixa moral do presidente". Que desinformados! E se ele presta (ou não) para o Brasil, o melhor lugar para analises é uma urna (não um estádio). A grande inversão: na arquibancada acham que refletem; nas eleições, que se alegram. Sensações alteradas em horas erradas. Mas a educação sempre no mesmo nível: zero.